O Brasil retomou a exigência de vistos para cidadãos dos Estados Unidos, Canadá, Japão e Austrália. A medida corrige a decisão unilateral do ex-presidente Jair Bolsonaro, que havia dispensado a exigência sem garantir o princípio da reciprocidade — base fundamental das relações internacionais. Nenhum desses países, ao longo dos anos, estendeu o mesmo benefício aos brasileiros.
Com o retorno de Donald Trump à presidência dos EUA, a situação dos brasileiros no país tem piorado. Mais de 500 pessoas foram repatriadas em condições humilhantes: algemadas, detidas e muitas vezes com documentação legal em ordem. Outras continuam presas, sem contato com as famílias — realidade compartilhada por migrantes latino-americanos em geral.
As ações dos EUA afrontam tratados e convenções que protegem os direitos dos migrantes. Entre os principais documentos internacionais, destacam-se:
O Brasil ratificou, em 2022, a Convenção da ONU sobre proteção aos trabalhadores migrantes e conta com a Lei nº 13.445/2017, que garante defesa ampla, assistência jurídica gratuita e proíbe deportações em massa e prisões administrativas. Os EUA, por outro lado, ainda não ratificaram diversos desses tratados.
Um dos pontos mais alarmantes é a deportação de crianças nascidas nos EUA — em clara afronta ao princípio do jus soli, que garante cidadania automática a quem nasce em solo americano. Mesmo que o chamado “turismo de natalidade” seja controverso, trata-se de uma prática legal. Retirar a cidadania dessas crianças é um desrespeito à própria Constituição dos EUA.
A insegurança jurídica para imigrantes também revela um contexto mais profundo: a crise da classe média americana. O empobrecimento, a perda de empregos industriais e a ascensão da China como potência econômica global pressionam a política interna dos EUA.
A China, com baixos custos e altos investimentos em tecnologia, conquistou mercados inteiros — inclusive os que antes eram dominados pelos norte-americanos. Ironicamente, foi o próprio modelo de globalização, impulsionado pelos EUA, que esvaziou sua base industrial.
Trump responde com medidas populistas: eleva tarifas, ataca migrantes e busca culpados externos. Mas a realidade é mais complexa: os EUA dependem de insumos globais para sua produção — aço brasileiro, tecnologia canadense, peças mexicanas e produtos chineses. Taxar importações encarece a cadeia produtiva interna.
Ao mesmo tempo, o governo norte-americano promete investimentos em empresas nacionais, mas favorece interesses privados. Esse desequilíbrio é identificado pelo economista Luiz Carlos Bresser-Pereira como patrimonialismo — quando o Estado serve mais aos interesses de grupos econômicos do que ao interesse público.
Com apenas três meses de novo mandato, Trump já provocou instabilidade global. Suas estratégias de blefe e confronto tornam o futuro das relações diplomáticas e econômicas cada vez mais incerto.
Frente a esse cenário, o Brasil acertou ao retomar a exigência de vistos e sinalizar medidas econômicas — como o possível aumento de tarifas sobre produtos americanos. Além disso, a ampliação de relações com os países dos BRICS e o fortalecimento do comércio regional são alternativas estratégicas em tempos de instabilidade global.
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