Gustavo Henrique de Brito Alves Freire DESTAQUE

A Advocacia, a legalidade, a liberdade de expressão e a necessidade de ter regras: Como harmonizar tantos pratos sem quebrar nenhum?

Postado em 26 de junho de 2025 Por Gustavo Henrique de Brito Alves Freire Advogado, ex-Conselheiro Federal e atual decano do Conselho Estadual da OAB/PE, 1° Vice-Presidente do Tribunal de Ética e Disciplina e Assessor Especial da Presidência da OAB/PE.

Em Aristóteles, princípio é a premissa maior de uma demonstração. Na linguagem científica, princípio é a verdade primaz, o ponto de partida, o alicerce. No Direito, é o padrão.

A advocacia, por princípio, é mais que a postulação jurídica. Ser advogado é ocupar a sentinela de defesa da higidez da Carta Magna Cidadã e seus fundamentos.

O juramento que o advogado presta ao se habilitar como tal (Regulamento Geral da Lei 8.906/1994, art. 20) não é mera formalidade. Nem a OAB é apenas um cartório arquivista (STF, ADI 3.026).  

Como membro por seis anos da CNDRD – Comissão Nacional de Defesa da República e da Democracia do Conselho Federal da OAB, pude, além dessas convicções, reforçar a de que não é crime a opção política, desde que fiel aos alicerces do texto constitucional. Se descabe a censura prévia, faceta das tiranias, descabe a premissa de liberdades ilimitadas.

O conceito racional de Estado Democrático de Direito abrange como fundamento a soberania popular, além dos seguintes outros elementos: (a) a conciliação entre democracia representativa, pluralista e democracia participativa efetiva; (b) um Estado Constitucional, ou seja, apetrechado de uma Constituição legítima, rígida, emanada da vontade do povo, dotada de uma supremacia que vincule a todos; (c) um órgão guardião dessa Constituição e dos valores essenciais da sociedade e que tenha atuação desimpedida; (d) um sistema de garantia dos direitos humanos; (e) um Poder Judiciário independente para a solução dos conflitos entre a sociedade, entre os indivíduos e destes com o Estado; e (f) segurança jurídica, controlando-se os excessos da produção normativa, propiciando-se previsibilidade.

Não à toa, uma sociedade só tem futuro na democracia se souber balancear deveres e direitos e equilibrá-los.

Quando hoje alguns criticam, até com virulência, a regulação das plataformas digitais, é preciso não esquecer da advertência do ex-Juiz da Suprema Corte dos EUA, Oliver Holmes, segundo quem a proteção mais rígida da liberdade de expressão não protege um homem que grite falsamente “fogo” em um teatro lotado e provoque pânico. Com isso, o limite do limite esbarra na censura, mas não é autorizado que o indivíduo sabote a escolha da maioria.

Para Dworkin, na democracia, ninguém, independentemente do quão poderoso seja, pode ter o direito de não ser insultado ou ofendido. Seria normalizar a intolerância. Mas não é indiferente penal que outro indivíduo venha a público incitar a ruptura institucional alegando ser livre para fazê-lo. Se o advogado pratica ato ou fala dessa natureza, dentro ou fora do desempenho profissional, não está imune à avaliação deontológica do órgão de classe.

O próprio Conselho Federal da OAB, em petição ao Supremo, a propósito dos eventos do 8 de janeiro de 2023 em Brasília, reafirmou que “(…) a Constituição Federal resguarda o direito à liberdade de expressão e de manifestação, enquanto garantias fundamentais do indivíduo, que não pode se valer no exercício desses direitos, do uso da violência para impor sua vontade ou para violar fundamentos e garantias também protegidas pela Carta Magna”.

Então não, não é uma questão de opção política. É uma questão de princípios. Se Deus não joga dados com o universo, como disse Einstein em carta a Born em 1926 para expressar que não acreditava no acaso, ao homem não é dado fazer o mesmo com a democracia.

Bem o alertou o sempre Ministro do STF, Celso de Mello, ao relatar o Habeas Corpus 82.424-2/RS (“Caso Ellwanger”): “A liberdade de expressão não pode amparar comportamentos delituosos que tenham, na manifestação do pensamento, um de seus meios de exteriorização, notadamente naqueles casos em que a conduta desenvolvida pelo agente encontra repulsa no próprio texto da Constituição”.

A certeza que fica é a de que o pensamento crítico brasileiro não perdeu a lucidez e não se permitiu seduzir pela retórica da ruptura, a despeito de todos os desafios da democracia. Resta, também, uma segunda certeza: a de que não se harmoniza com a singular dimensão constitucional da advocacia, função social, munus e sacerdócio, o comportamento propelido pelo golpismo. Liberdade caminha de mãos dadas com Responsabilidade. Matrimônio indissolúvel.

BIBLIOGRAFIA

  1. https://hojecentrosul.com.br/editorialo-que-fazer-diante-da-polarizacao-politica.
  2. https://www.correiobraziliense.com.br/opiniao/2022/08/5028435-artigo-a-democracia-e-a-advocacia-sao-indivisiveis.html.
  3. https://www.conjur.com.br/2022-nov-22/furtado-coelho-democracia-tempos-provacao.
  4. www.oab.org.br.
  5. POPPER, Karl. “A SOCIEDADE ABERTA E SEUS INIMIGOS”. Trecho em língua portuguesa extraído de https://investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/filosofia/338330-nao-devemos-tolerar-os-intolerantes.
  6. LOBO, Paulo. “COMENTÁRIOS AO ESTATUTO DA ADVOCACIA E DA OAB”, 14ª edição, São Paulo: editora Saraiva, 2022.

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