Edila Maria Romao da Silva 1

A saúde mental dos advogados: Uma análise sobre a incidência da Síndrome de Burnout na advocacia brasileira

Postado em 01 de outubro de 2025 Por Edila Maria Romão da Silva Acadêmica em direito - Curso concluso pela Estácio Abdias de Carvalho 2025.1

1. INTRODUÇÃO

O exercício da advocacia é historicamente associado à alta carga intelectual, responsabilidade ética e constante tensão emocional. Em um ambiente marcado por disputas judiciais, prazos rigorosos e pressão por resultados, os advogados frequentemente se veem diante de um ritmo de trabalho extenuante. Neste cenário, a Síndrome de Burnout desponta como uma das principais ameaças à saúde mental desses profissionais. Na classificação internacional de doenças (CID), a OMS descreve o burnout como “uma síndrome resultante de um estresse crônico no trabalho que não foi administrado com êxito” e que se caracteriza por três elementos: “sensação de esgotamento físico e psicológico, cinismo ou sentimentos negativos relacionados a seu trabalho e eficácia profissional reduzida”. A síndrome do esgotamento profissional é resultante do estresse crônico no local de trabalho que não foi gerenciado com sucesso, tendo como nexo causal,  a evolução de uma doença preexistente. O grande problema neste caso é a subnotificação se o diagnóstico for incorreto, muitas vezes o trabalhador não relata que a doença está relacionada ao ambiente laboral, e ela é diagnosticada como depressão, ansiedade e crise de pânico.

A síndrome de burnout já é conhecida no meio jurídico brasileiro como uma doença ocupacional pelas inúmeras demandas judiciais em busca dos direitos e garantias dos empregados e segurados. É de responsabilidade do empregador evitar o adoecimento de seus funcionários, assim como zelar por um ambiente de trabalho saudável, seja presencial ou remoto, apontam os especialistas, com manutenção de um ambiente de trabalho seguro e saudável. Além disso, é importante ter atenção às metas que são propostas, de modo que estejam dentro de um contexto de razoabilidade, principalmente ao considerar que as metas abusivas têm sido um dos principais fatores de esgotamento profissional.

Associado a essas condutas, o empregador deve desenvolver programas preventivos em segurança e medicina do trabalho, com acompanhamento rigoroso e fiscalização quanto ao cumprimento, sendo fundamental a realização de exames periódicos incluindo acompanhamento psicológico e a tentativa de manutenção de um ambiente de trabalho sadio sem excessos de jornada e respeito ao descanso dos trabalhadores tanto no trabalho presencial quanto em home office.

Na Justiça do Trabalho, a responsabilidade das empresas será avaliada a partir da análise do laudo médico comprovando a existência da síndrome de burnout, evidenciando o histórico do trabalhador e avaliação do ambiente laboral, inclusive relatos de testemunhas.

Além disso, buscar comprovações de degradação emocional e fatores causadores da síndrome, como assédio moral, metas excessivas ou cobranças agressivas e competitividade.

Dessa forma, caberá às empresas garantirem programas preventivos para evitar a síndrome de burnout, com o propósito de programar ações que, além de preservar a saúde mental do colaborador, possam contribuir com o crescimento da corporação.

A síndrome de burnout é um quadro psicológico prolongado, associado a uma percepção de exaustão, esse cansaço excessivo é associado a uma forte perda de interesse e engajamento nas atividades de trabalho. Além disso, a percepção grande de esforço é somada a sentimentos negativos, como frustração, depressão ou a ausência de significado associado ao trabalho, ou seja, a pessoa entende que se esforça ao máximo, mas não consegue ver nenhum fruto associado ao seu trabalho, não vê para onde vai toda essa dedicação. Em muitos casos  a percepção é que se alcançou pouco ou que foi conquistado não tem valor ou até mesmo importância.

Os sintomas mais comuns são sensação de esgotamento físico e mental, perda de interesse nas atividades de trabalho, sentimentos negativos associados ao ambiente de trabalho, falta de motivação para trabalhar, irritabilidade, depressão, ansiedade, baixa autoestima, dificuldade de concentração e pessimismo.

Alguns sintomas também podem ser físicos, como dores de cabeça constantes, enxaqueca, fadiga, palpitação, pressão alta, tensão muscular, insônia, problemas gastrintestinais, gripes e resfriados recorrentes.

O início dos sintomas geralmente se dar por um acúmulo de tarefas, um excesso de responsabilidades e um nível de exigência e pressão exagerada associada a uma alta demanda de trabalho. Esse cenário tende a favorecer a sensação de impotência e a falta de perspectiva, que junto com a sobrecarga de trabalho permitem o quadro exaustivo e por consequência desmotiva o colaborador, associando a uma desconexão entre aspectos importantes como o volume de trabalho, a percepção de controle do indivíduo sobre a situação, seu reconhecimento e as relações com as pessoas, inclusive os gestores.

Além disso, diversos canais de comunicação disponíveis pode levar a uma sensação de sobrecarga gerando dificuldade de alinhamento de prioridades, com excesso de cobranças, falhas de comunicação, sentimentos negativos com baixa autoestima e percepção de maior distanciamento e frieza por parte dos gestores ou da empresa.

A tecnologia permite mais autonomia, gerando a sensação de que as pessoas devem estar disponíveis para o trabalho constantemente, uma vez que podem responder e-mails e mensagens facilmente do seu celular. Isso traz um excesso enorme de cobrança pessoal e carga horária, mesmo quando a pessoa está fora do escritório o que, associado às cobranças e pressão, pode piorar ou favorecer um quadro de burnout.

É fundamental o controle do estresse e o exercício saudável da liderança para a prevenção. É importante que os gestores estejam atentos aos seus colaboradores, percebendo que algum funcionário possa estar sob grande pressão, sobrecarregado ou desenvolvendo uma possível frustração associada ao trabalho, ele deve buscar formas de reverter o cenário

2. A SÍNDROME DE BURNOUT

O termo Burnout foi introduzido por Freudenberger (1974) para descrever o esgotamento emocional sofrido por profissionais da área da saúde. Posteriormente, Maslach e Jackson (1981) definiram a síndrome como um transtorno psíquico caracterizado por três dimensões: Exaustão emocional: sensação de esgotamento físico e mental; Despersonalização: atitudes negativas e distanciadas em relação ao trabalho e às pessoas envolvidas; Redução da realização pessoal: sentimento de incompetência e fracasso profissional.

De acordo com a Classificação Internacional de Doenças (CID-11), a Síndrome de Burnout é classificada como um “fenômeno ocupacional”, e não como uma doença mental em si, embora seus efeitos possam ser tão severos quanto transtorno psiquiátrico.

3. FATORES DE RISCO NA ADVOCACIA

A atuação na advocacia tem revelado uma série de fatores que contribuem significativamente para o desenvolvimento da Síndrome de Burnoutentre os profissionais da área. Entre os principais elementos de risco, destaca-se a carga horária excessiva, uma vez que muitos advogados exercem jornadas superiores a dez horas diárias, incluindo finais de semana e feriados. Soma-se a isso a pressão constante por resultados, que impõe metas elevadas e expectativas de alto desempenho, resultando em profundo desgaste emocional.

O ambiente altamente competitivo também exerce um papel relevante, à medida que a disputa por clientes, reconhecimento e espaço no mercado jurídico intensifica a ansiedade e depressão estimulando comparações nocivas. Além disso, o cotidiano profissional envolve o contato direto com conflitos complexos, decisões judiciais desfavoráveis e exigências por parte de clientes e magistrados, o que contribui para o aumento do estresse.

Outro aspecto preocupante é o isolamento profissional, especialmente entre advogados autônomos, que frequentemente enfrentam a ausência de suporte institucional, o que pode gerar sentimentos de solidão, sobrecarga e desamparo emocional. Esses fatores, de forma cumulativa, criam um ambiente propício ao esgotamento físico e mental característico do Burnout.

4. CONSEQUÊNCIAS DA SÍNDROME DE BURNOUT NA ADVOCACIA

A Síndrome de Burnout entre advogados pode acarretar uma série de consequências graves, tanto no âmbito pessoal quanto profissional. Entre os efeitos mais recorrentes, destacam-se o desenvolvimento de transtornos psíquicos, como ansiedade generalizada e quadros depressivos, que comprometem significativamente a saúde mental do indivíduo.

Do ponto de vista físico, são comuns sintomas como insônia, hipertensão arterial, cefaleias constantes e dores musculares crônicas, associados ao estresse prolongado. No aspecto profissional, o Burnout compromete diretamente o desempenho do advogado, refletindo-se em queda na produtividade, falhas técnicas, perda de foco e aumento de erros processuais.

Tais condições podem levar a afastamentos frequentes por motivos de saúde, concessão de licenças médicas, e, em casos mais severos, à descontinuidade da carreira ou à migração para outras áreas menos exigentes emocionalmente.

Além das implicações individuais, o Burnout impacta de forma negativa a qualidade dos serviços jurídicos prestados, gerando prejuízos não apenas para os clientes, mas também para a eficiência e credibilidade do sistema de justiça como um todo.

5. ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO E PREVENÇÃO

O enfrentamento da Síndrome de Burnout na advocacia demanda a adoção de medidas articuladas em três esferas complementares: individual, organizacional e institucional. No âmbito individual, é fundamental que o advogado desenvolva práticas voltadas à preservação de sua saúde física e emocional, como a realização regular de atividades físicas, a delimitação de jornadas de trabalho equilibradas, a busca por acompanhamento psicológico e o incentivo ao lazer e à convivência social, de modo a reduzir os níveis de estresse acumulado.

No plano organizacional, os escritórios de advocacia desempenham papel central na promoção de ambientes laborais saudáveis. Isso inclui a definição de metas realistas, a manutenção de uma comunicação interna clara e respeitosa, bem como a implementação de programas de apoio emocional e ações que valorizem o equilíbrio entre vida pessoal e profissional.

Já em nível institucional, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) pode contribuir significativamente por meio do fortalecimento de campanhas de conscientização sobre saúde mental, da criação de canais permanentes de acolhimento e orientação psicológica, além da inclusão sistemática do tema nos programas de formação inicial e continuada da advocacia. Essas medidas, quando integradas, são essenciais para prevenir o adoecimento psíquico dos profissionais e promover uma cultura de cuidado dentro da classe jurídica.

6. CONCLUSÃO

A Síndrome de Burnout configura um grave problema de saúde pública que afeta de maneira alarmante a advocacia brasileira. O elevado nível de estresse, a sobrecarga emocional constante e a pressão por desempenhos enfrentados cotidianamente pelos advogados impõem não apenas riscos à integridade psíquica desses profissionais, mas também comprometem a qualidade da atuação jurídica e, por consequência, o próprio funcionamento do sistema de justiça. Diante desse cenário, torna-se indispensável a implementação de ações integradas de prevenção, acolhimento e reestruturação das condições laborais, com foco na promoção da saúde mental no ambiente jurídico.

É fundamental que o tema deixe de ser tratado como tabu dentro da profissão e passe a integrar a agenda prioritária das instituições jurídicas, dos órgãos de classe e das organizações empregadoras. A negação ou minimização do sofrimento psíquico só contribui para o agravamento dos quadros clínicos, a cronificação dos sintomas e o afastamento de profissionais altamente capacitados. Políticas institucionais efetivas, pautadas na valorização da saúde emocional, no suporte psicológico e na revisão dos modelos de gestão e produtividade, devem ser urgentemente adotadas. Além disso, o engajamento das universidades, conselhos e escritórios na formação de uma cultura de cuidado e prevenção é essencial para que a advocacia possa ser exercida com dignidade, equilíbrio e qualidade de vida.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • CONSELHO FEDERAL DA OAB. Relatório sobre Saúde Mental na Advocacia. Cartilha da Saúde Mental da Advocacia Setembro 2021
  • NR‑1 e exigência de avaliação de riscos psicossociais
    Em resposta ao aumento de casos, a Norma Regulamentadora nº 1 foi revisada para incluir diretrizes sobre saúde mental e obrigatoriedade de mapear riscos psicossociais no ambiente de trabalho, a partir de meados de 2025 (ou em processo de implantação). Fius+1
  • ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS). Classificação Internacional de Doenças – CID-11, 2022.
  • Reconhecimento da OMS como doença ocupacional
    A Síndrome de Burnout passou a figurar na CID‑11, sendo reconhecida oficialmente como uma doença ocupacional a partir de 2022, pela Organização Mundial da Saúde. nazarioadvogados.com.br+2EcoDebate+2

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