Aline Alves dos Santos

A voz da terra é feminina: A força da ANMIGA na COP 30”

Postado em 01 de novembro de 2025 Por Aline Alves dos Santos Graduanda do 3º período de Direito pela FICR e orgulhosamente indígena Xukuru do Ororubá. Com dedicação aos estudos, busca adquirir experiência prática e construir uma carreira sólida no Direito. Sua trajetória é inspirada na força e nos valores de sua etnia.

A participação da Articulação Nacional das Mulheres Indígenas Guerreiras da Ancestralidade (ANMIGA) na COP 30 representa um marco essencial para a discussão sobre justiça climática, direitos indígenas, gênero e saberes ancestrais. Trata-se de mais do que levar algumas vozes aos corredores internacionais: é um potente gesto coletivo de mulheres indígenas de todos os biomas do Brasil — Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampas e Pantanal — que se organizam para afirmar seu protagonismo. Conforme a própria ANMIGA define-se, “mulheres terra, mulheres água, mulheres biomas, mulheres espiritualidade, mulheres árvores, mulheres raízes, mulheres sementes … guerreiras da ancestralidade”.  

A força dessa articulação está justamente no caráter coletivo. Em vez de isolar lideranças, a ANMIGA busca construir uma rede nacional que conecta saberes, memórias, práticas de resistência e cuidado presentes em cada bioma. Esse vínculo entre diferentes territórios e povos amplia a voz das mulheres indígenas para além de suas aldeias, elevando-as como guardiãs da Mãe Terra e interlocutoras legítimas em fóruns globais. Em seu manifesto, afirmam: “Somos sementes plantadas através de nossos cantos por justiça social, por demarcação de território, pela floresta em pé, pela saúde, pela educação, para conter as mudanças climáticas e pela ‘Cura da Terra’.”  

Quando essas mulheres adentram a COP 30, elas trazem à mesa algo que vai além de gases de efeito estufa e políticas de carbono — elas carregam saberes ancestrais de cuidado com o território, de convivência com a natureza, de gerações que viveram e vivem uma relação de reciprocidade com a Terra e os biomas. Como afirmado num estudo que analisa a ANMIGA: “A floresta é nossa casa, nosso lugar, nossa farmácia… As mulheres sempre estiveram nas comunidades resgatando nossos hábitos, nossos remédios e plantas.”  

Esses saberes são particularmente relevantes em um mundo que enfrenta crise climática, ecológica e social. Eles lembram que a crise ambiental não se resume a tecnologias ou finanças, mas também ao modo como as sociedades se relacionam com a Terra, com o coletivo, com a vida. As mulheres indígenas, por meio da ANMIGA, fazem a ponte entre direitos humanos, direitos territoriais, justiça de gênero e cuidados ancestrais. Por exemplo, o relatório da ANMIGA ao Comitê sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (CEDAW) define que “o direito à biodiversidade não se separa dos territórios” — “Para nós mulheres indígenas a biodiversidade não se separa dos territórios, é fundamental que o Estado Brasileiro efetive a Demarcação das Terras Indígenas…”  

Além disso, a luta das mulheres indígenas no Brasil enfrenta múltiplas frentes: a violência de gênero, o racismo estrutural, a violência territorial advinda de invasões, mineração, flexibilização ambiental. A ANMIGA tem atuado fortemente para garantir que essas violações sejam escutadas, denunciadas e enfrentadas. Já promoveram mobilizações nacionais, como as marchas das mulheres indígenas, em que diversas mulheres de diferentes povos se reúnem para afirmar que seus corpos são territórios, suas terras são vidas.  

Portanto, a presença da ANMIGA na COP 30 ganha um valor simbólico e prático: simbólico porque desafia a invisibilidade histórica das mulheres indígenas e reafirma sua centralidade como protagonistas na proteção dos biomas, das águas, da Terra. Prático porque leva suas reivindicações às deliberações de políticas climáticas e ambientais, reforçando que os debates sobre o clima devem incluir justiça territorial, cultural, de gênero e indígena. Estar na COP 30 significa, para a ANMIGA, “não sermos apenas vítimas dos impactos, mas agentes de cura e transformação” — como se expressa em seu manifesto.  

Para você, que estuda Direito e está interessada em abordar a realidade de estudante indígena na faculdade de Direito, a atuação da ANMIGA constitui um exemplo poderoso: demonstra que direito não é apenas teoria ou técnica, mas também luta, saberes, existência. Em espaços como a COP 30, o direito se articula com ancestralidade, território, coletividade e justiça intergeracional. A articulação das mulheres indígenas brasileiras mostra que a defesa dos territórios passa por compreensão cultural, comunitária e ancestral, e não apenas por articulações jurídicas. Assim, a participação da ANMIGA na COP 30 reforça que quando mulheres originárias se articulam, não apenas resistem — elas propõem, transformam, curam.

Concluo, portanto, que a força coletiva da ANMIGA é imprescindível para uma agenda climática justa, inclusiva e de direitos. Levar os saberes ancestrais e a voz das mulheres indígenas para o centro das negociações mundiais significa reconhecer que elas não são apêndices: são fundamentais para o futuro da Terra, dos biomas, da humanidade.

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