Anna Luiza Luna de Araujo Mendonca

Direitos autorais em peças processuais: Possibilidade de reconhecimento da obra Jurídica como objeto de proteção autoral

Postado em 10 de setembro de 2025 Por Anna Luiza Luna de Araújo Mendonça Advogada, regularmente inscrita na Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional Pernambuco (OAB/PE 67.340). Bacharel em Direito pela Faculdade Damas da Instrução Cristã, possui experiência consolidada no contencioso cível, com destaque para as áreas de direito bancário e direito médico. Atuou em escritórios de grande porte, assessorando instituições financeiras e operadoras de saúde em demandas de elevada complexidade e volume processual. Atualmente, exerce atividades jurídicas no setor empresarial, com enfoque em contratos, distratos, negociações e elaboração de peças processuais. Demonstra interesse acadêmico em Direito Civil e Processo Civil, áreas em que pretende aprofundar sua formação por meio de pós-graduação e pesquisa, visando à construção de carreira voltada à advocacia estratégica e à coordenação de equipes jurídicas.

1. Introdução

A Lei nº 9.610/1998 (Lei de Direitos Autorais – LDA) regula a proteção de obras literárias, artísticas e científicas, assegurando direitos morais e patrimoniais aos seus autores. Entretanto, persiste a dúvida: as peças processuais produzidas pelos advogados podem ser reconhecidas como obras intelectuais?

Essa questão é relevante diante da prática comum de reprodução de petições sem menção à autoria, situação que levanta problemas éticos, civis e até penais. O objetivo geral deste artigo é analisar se os documentos jurídicos elaborados no exercício da advocacia podem ser enquadrados no conceito de obra protegido pela LDA. Os objetivos específicos incluem: (i) examinar a evolução histórica da proteção autoral; (ii) identificar as principais características das peças processuais; e (iii) avaliar a possibilidade de proteção das petições pela legislação vigente.

A pesquisa é qualitativa, descritiva e bibliográfica, fundamentada em doutrina, legislação e jurisprudência.

2. Evolução e Fundamentos dos Direitos Autorais

A proteção da criação intelectual ganhou forma jurídica apenas a partir da modernidade, com a invenção da imprensa e a necessidade de regulamentar a reprodução de obras. O Statute of Anne (1710), na Inglaterra, foi o primeiro diploma legal específico sobre direitos autorais.

No Brasil, a proteção começou com a Lei Imperial de 1827 e se consolidou com a Lei nº 5.988/1973, sucedida pela Lei nº 9.610/1998, ainda em vigor. A Constituição Federal de 1988 assegura, em seu artigo 5º, incisos XXVII e XXVIII, a proteção aos autores e às suas criações intelectuais.

A LDA protege tanto os direitos morais (paternidade, integridade, ineditismo) quanto os patrimoniais (exploração econômica da obra por 70 anos após a morte do autor). A obra, contudo, deve apresentar criatividade e originalidade para ser protegida.

3. Peças Processuais no Sistema Jurídico Brasileiro

As peças processuais são instrumentos pelos quais se concretiza o direito de ação e de defesa. Entre as principais, destacam-se:
– Petição inicial (exordial): inaugura o processo judicial, delimitando fatos, fundamentos e pedidos.
– Contestação: principal forma de defesa do réu, na qual se concentram todos os argumentos de fato e de direito.
– Recursos: instrumentos para reanálise de decisões judiciais, garantindo o duplo grau de jurisdição.

Embora possuam finalidade utilitária, tais peças podem ser elaboradas com criatividade e inovação, ultrapassando o caráter meramente técnico. Nesses casos, a produção intelectual do advogado pode se enquadrar no conceito de obra literária protegido pela LDA.

4. Reprodução Indevida e Repercussões Jurídicas

A utilização não autorizada de petições ou teses jurídicas de outros profissionais pode gerar diferentes consequências:
– Responsabilidade civil: indenização por danos materiais e morais decorrentes da contrafação.
– Responsabilidade penal: crime de violação de direitos autorais (art. 184 do Código Penal), especialmente em casos de plágio.
– Responsabilidade ética: infração disciplinar prevista no Estatuto da OAB e no Código de Ética, com penas que variam de censura à suspensão.

A jurisprudência e a doutrina reconhecem que a reprodução integral ou parcial de obras jurídicas sem autorização caracteriza ilícito. Ainda assim, permanece a resistência cultural em admitir a peça processual como objeto de proteção autoral.

5. Considerações Finais

A análise realizada permite concluir que as peças processuais podem, em determinadas circunstâncias, ser reconhecidas como obras intelectuais tuteladas pela Lei de Direitos Autorais. Quando dotadas de criatividade e originalidade, as petições transcendem a função utilitária e adquirem natureza literária.

O reconhecimento da proteção autoral nesse campo não elimina a função social do direito, mas garante respeito à autoria, desestimulando o plágio e valorizando a advocacia. É necessário, portanto, consolidar o entendimento de que a produção jurídica criativa é passível de tutela autoral, fortalecendo o exercício ético e responsável da profissão.

Referências

ALVES, Isabela de Sena Passau; CEOLIN, Monalisa. Direitos autorais no Brasil. Politize, 2019.

BARROS, Rodrigo. Direito Autoral: evolução histórica. 2007.

BITTAR, Carlos Alberto. Direito de Autor. São Paulo: RT, 2008.

BRANCO, Sergio; PARANAGUÁ, Pedro. Direito Autoral. 2009.

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988.

BRASIL. Lei nº 9.610, de 19 de fevereiro de 1998 (Lei de Direitos Autorais).

BRASIL. Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940).

COUTINHO, João. Direito Autoral e a Advocacia. 2019.

TUMULERO, Adriana. Plágio e contrafação na advocacia. 2017.

A Editora OAB/PE Digital não se responsabiliza pelas opiniões e informações dos artigos, que são responsabilidade dos autores.

Envie seu artigo, a fim de que seja publicado em uma das várias seções do portal após conformidade editorial.

Gostou? Compartilhe esse Conteúdo.

Fale Conosco pelo WhatsApp
Ir para o Topo do Site