Há muito tempo tenho refletido sobre a figura do MEI e realizados cálculos singelos sobre o quanto o MEI investe na Previdência Social e o quanto receberá ao se aposentar. Pois bem, o MEI paga mês a mês uma alíquota reduzida de 5% do salário-mínimo vigente, hoje o correspondente a R$ 75,90. Para uma mulher aposentar são necessários mínimos 15 anos de contribuição (180 contribuições) e 62 anos de idade, ou seja, serão pagas 180 contribuições de 5% do salário-mínimo, totalizando R$ 13.662,00. Considerando a expectativa de vida da mulher, segundo IBGE em 2023, de 78 anos, ela receberá a aposentadoria por 16 anos, todavia pagou por 15 (correspondente a 180 contribuições) e receberá 208 prestações, pois tem direito ao 13º salário, além de poder deixar pensão por morte.
Dito de outra forma, pagará R$ 13.662,00 e receberá R$ 315.120,00 (em valores fixos), ou ainda, 23 vezes a mais do que pagou. O raciocínio se aplica igualmente aos homens, exceto pela idade, que é de 65 anos. Ou seja, a alíquota reduzida de 5% é insustentável.
Importante registrar que o número de trabalhadores inscritos no MEI cresceu de 44 mil, no final de 2009, para cerca de 16,3 milhões no final de 2024, sendo 69,4% dos MEIs ativos no país criados a partir de 2018, curiosamente após a reforma trabalhista que ampliou as possibilidades de terceirização de atividades das empresas.
Assim, muitas empresas, para reduzir custos com pessoal, têm demitido seus funcionários e proposto uma nova modalidade de contratação, como “prestador de serviços”, um modelo no qual fica nítida a precarização do trabalho formal, especialmente no que diz respeito aos direitos trabalhistas e à estabilidade econômica. Com frequência atendo clientes engenheiros, administradores, professores, entre outros autônomos, que deveriam contribuir como contribuinte individual, pagando 20% sobre seus ganhos, mas que prestam serviços como MEI, apesar de terem renda muito superior ao que indicam para se enquadrar na categoria de microempreendedor individual, sendo clara a burla ao sistema previdenciário.
Essa realidade se traduz em números, posto que o crescimento de MEIs saltou de 1,2% para 10,7% entre 2011 e 2023, correspondendo a 47,7% do total de contribuintes individuais. Ao passo que os contribuintes individuais foram reduzidos drasticamente, regime mais sustentável do ponto de vista financeiro e atuarial.
Dados do IBGE (2024) mostram que a maioria das pessoas enquadradas no MEI é de pessoas que estavam no mercado de trabalho, com carteira assinada antes de se tornarem MEI e que quase 3 em cada 4 MEIs tinham outra experiência no mercado formal de trabalho, inclusive, em vários casos, de forma concomitante como MEI. Ou seja, o MEI não está incluindo informais, ao revés, está excluindo os formais!
Penso que o MEI foi criado com boas intenções, mas os dados mostram que houve desvirtuação do sistema que pode gerar efeitos colaterais muito negativos no médio e longo prazo, demandando reestruturação urgente, além de debate sobre alíquotas de contribuição realmente sustentáveis financeira a atuarialmente. Afinal, o futuro da Previdência Social é de interesse coletivo e deveria ser uma preocupação de todos os brasileiros.
A Editora OAB/PE Digital não se responsabiliza pelas opiniões e informações dos artigos, que são responsabilidade dos autores.
Envie seu artigo, a fim de que seja publicado em uma das várias seções do portal após conformidade editorial.