Kize Lima

Maternidade atípica, câncer de mama e direitos: Uma análise da dupla vulnerabilidade

Postado em 22 de outubro de 2025 Por Kize Lima Acadêmica de Direito, Assistente Jurídica, Pesquisadora sobre Direito Previdenciário e Maternidade Atípica. Integrante das Comissões de Direito Médico e da Saúde e da Jovem Advocacia na OAB Cabo de Santo Agostinho - PE.

A prevenção e a conscientização sobre o Câncer de Mama impulsionaram a criação do movimento global conhecido como Outubro Rosa. O objetivo é difundir informações sobre sinais e sintomas para que se possa obter o diagnóstico precoce, detectar e combater a doença nos estágios iniciais aumentando as chances de cura. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o câncer de mama é o mais incidente em mulheres no mundo todo. Para o triênio 2023-2025, o INCA estimou cerca de 73.610 novos casos da doença, que já vitimou mais de 20 mil mulheres no Brasil, sendo considerado um importante problema de saúde pública no país. Receber um diagnóstico de câncer de mama pode ser bem desafiador, inclusive se a mulher também enfrenta uma jornada intensa como mãe atípica. Esse cenário pode demonstrar uma dupla vulnerabilidade na vida dessa mulher.

A Sobrecarga Silenciosa: Fatores de Risco e a Negligência do Autocuidado na Maternidade Atípica

 O debate sobre maternidade atípica relacionada à prevenção do Câncer de Mama, torna-se essencial se observarmos a rotina extenuante de mães que cuidam de filhos com deficiência. A jornada de cuidados pode resultar em desgastes físicos e emocionais. Para a mãe atípica, o autocuidado precisa estar incluído no seu cotidiano, ainda mais se houver probabilidades dessa mulher desenvolver câncer de mama ao longo da vida. Todavia, a sobrecarga que essa mãe vivencia pode desencadear diversas situações tais como:

  • Estresse Elevado: Demandas como terapias, consultas médicas, administração de medicamentos e outros cuidados do filho com necessidades especiais podem elevar os níveis de cortisol, o hormônio do estresse, afetando o sistema imunológico e o equilíbrio hormonal da mulher. Embora esses fatores isolados não provoquem o surgimento do câncer diretamente, podem contribuir com o desequilíbrio de hábitos saudáveis, tornando o corpo mais vulnerável a doenças;
  • Fadiga e Privação do Sono: Existem muitas mães atípicas que não possuem uma rotina de sono adequada. Sono fragmentado e/ou noites mal dormidas podem comprometer a saúde e a recuperação das células do corpo;
  • Falta de Tempo de Cuidar de Si Mesma: Cuidados básicos, como a prática de atividade física, consultas médicas periódicas, exames de rotina (como a mamografia anual, a depender da idade da mulher), alimentação saudável e boas noites de sono nem sempre estão presentes na vida dessa mãe.

O Diagnóstico de Câncer e a Vivência de Duas Jornadas de Luta

Quando uma mãe atípica descobre que tem câncer de mama, ela não enfrentará apenas uma doença considerada grave, mas a confrontação de duas realidades delicadas – seu tratamento e o do filho. Nesse contexto a doença pode impor desafios que, a priori, podem ser difíceis de lidar. O tratamento da doença, por exemplo, demandará tempo para consultas médicas, medicações, quimioterapias, radioterapias, cirurgias e exames clínicos em geral. Tudo isso pode tornar a mulher ainda mais vulnerável física e emocionalmente. Sentimentos como o medo, a insegurança, traumas mediante a dor física, solidão, angústia podem surgir durante a jornada em busca da cura. Makluf, Dias, Barra (2006) afirmam

Por isso, é necessário promover cuidado e acolhimento para essa fase da vida da mulher. Não só porque ela já vivencia uma trajetória de luta que a própria maternidade atípica impõe, mas também porque ela precisará de todo suporte possível. Esta dupla vulnerabilidade: Maternidade Atípica e Câncer de Mama exigirá que o poder público e a sociedade reconheçam:

  • A Importância da Flexibilização do Tratamento: Ajustes à rotina da mãe, garantindo o máximo de conforto e versatilidade para que não aja interrupções no tratamento do filho;
  • Apoio Psicológico: A mãe precisa entender que cuidar de si mesma em todas as fases da doença não implica em “negligenciar” o filho, inibindo o sentimento de “culpa materna” que possa surgir;
  • Garantia de Direitos de Forma Desburocratizada: A concessão de auxílios, afastamentos das atividades laborativas para que a mãe tenha recursos para lidar com a doença e se concentre na sua recuperação e no seu bem-estar e no do filho;
  • Redes de Apoio: Para que a mãe se sinta menos sobrecarregada e possa se dedicar ao tratamento da melhor forma possível sem deixar de cuidar do filho.

Essas são algumas ações que visam reduzir essa dupla vulnerabilidade e permitir que essa mulher consiga ter estabilidade emocional para que não “desmorone” e acabe comprometendo seu tratamento e sua recuperação. Diante disso é fundamental que o poder público em parceria com instituições privadas de saúde e a sociedade reconheçam essa realidade e adotem medidas, como exemplo as citadas anteriormente, assim como outros mecanismos de proteção e cuidado para todas as mulheres diagnosticadas com câncer de mama, em especial, às mães atípicas.

Em suma, o cuidado da mãe atípica é primordial principalmente na luta contra o câncer de mama. Enfrentar o tratamento contra a doença e o tratamento do filho com deficiência exigirá dessa mãe esforços maiores e só com suporte emocional, financeiro e social que essa dupla jornada poderá ser trilhada com mais tranquilidade. A sociedade e o poder público precisam reconhecer a vulnerabilidade promovendo políticas e redes de apoio que garantam a continuidade do cuidado entre mãe e filho, sem negligenciar a recuperação e o bem-estar de ambos. Somente com um olhar profundo de empatia e de inclusão será possível assegurar o cuidado integral da mulher no combate ao câncer de mama.

Referências Bibliográficas

BRASIL. Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Estatísticas de câncer. Rio de Janeiro, 3 abr. 2025. Disponível em: https://www.gov.br/inca/pt-br/assuntos/cancer/numeros. Acesso em: 15 out. 2025.

BRASIL. Ministério da Saúde. Outubro Rosa – Mês de Conscientização Sobre o Câncer de Mama. Brasília, DF: BVSMS, [2021?]. Disponível em: https://bvsms.saude.gov.br/outubro-rosa-mes-de-conscientizacao-sobre-o-cancer-de-mama-2/. Acesso em: 15 out. 2025.

CAMPOS, Ana Cristina. Inca estima 73,6 mil novos casos de câncer de mama no Brasil em 2025. Agência Brasil, Rio de Janeiro, 3 out. 2025. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2025-10/inca-estima-736-mil-novos-casos-de-cancer-de-mama-no-brasil-em-2025. Acesso em: 15 out. 2025.

FEMAMA. Outubro Rosa 2025. Porto Alegre, [2025]. Disponível em: https://femama.org.br/site/outubro-rosa/. Acesso em: 21 out. 2025.

RAMOS, Bianca Figueiredo; LUSTOSA, Maria Alice. Câncer de mama feminino e psicologia. Revista da SBPH, Rio de Janeiro, v. 12, n. 1, p. 32-48, jun. 2009. Disponível em:https://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582009000100007. Acesso em: 21 out. 2025.

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