Micael Kennedy Ferreira de Oliveira

A importância do inquérito policial

Postado em 05 de novembro de 2025 Por Micael Kennedy Ferreira de Oliveira estudante de Direito do 3º período da Faculdade Católica Imaculada da Conceição do Recife. Tenho grande interesse pelas áreas Penal e Civil, nas quais venho direcionando meus estudos e construindo uma base sólida para minha formação jurídica e futura atuação profissional.

O inquérito policial ocupa posição central na persecução penal brasileira, sendo o principal instrumento da fase pré-processual do sistema de justiça criminal. Sua função vai além da mera investigação, atuando como mecanismo de garantia da legalidade, proteção dos direitos fundamentais e prevenção de abusos na aplicação do direito penal. Historicamente concebido como procedimento administrativo de caráter inquisitivo, destinado à coleta de elementos informativos para subsidiar o Ministério Público na propositura da ação penal, o inquérito evoluiu com o fortalecimento do Estado Democrático de Direito e a incorporação de princípios constitucionais, consolidando-se como etapa essencial para a proteção da sociedade e do investigado.

No Brasil, o inquérito policial foi instituído pelo Decreto nº 4.824/1871 e posteriormente consolidado no Código de Processo Penal de 1941, passando por diversas reformulações doutrinárias e práticas que o alinharam ao sistema acusatório contemporâneo. Conforme Guilherme de Souza Nucci (2020), trata-se de procedimento administrativo presidido pela autoridade policial, destinado à apuração da autoria e das circunstâncias de infrações penais. Sua natureza é informativa e preparatória, caracterizando-se pelo sigilo, forma escrita e discricionariedade técnica da autoridade, elementos que, interpretados à luz da Constituição Federal de 1988, garantem a legalidade e a proteção de direitos fundamentais.

O respaldo constitucional encontra-se no art. 144, §4º, que atribui à Polícia Civil a função de polícia judiciária e a apuração das infrações penais, exceto militares. Segundo Alexandre de Moraes (2022), a persecução penal deve observar o devido processo legal desde o início das investigações, sendo o inquérito instrumento que materializa princípios como ampla defesa, presunção de inocência e dignidade da pessoa humana. Nesse contexto, o delegado de polícia atua como garantidor da legalidade, conduzindo a investigação de forma imparcial, técnica e dentro dos limites legais, consolidando o equilíbrio entre eficiência investigativa e proteção dos direitos do investigado.

A função primordial do inquérito policial é fornecer subsídios ao Ministério Público para a adequada formação da opinio delicti. Conforme Renato Brasileiro de Lima (2021), cumpre funções informativa, preventiva e garantidora: coleta de provas, prevenção de abusos e proteção do investigado contra persecuções indevidas. Na prática forense, é a base inicial sobre a qual se estrutura a ação penal, sendo reconhecido pelo Superior Tribunal de Justiça o valor probatório dos elementos colhidos, desde que confirmados em juízo (STJ, HC 597.405/RS, 2020). A Lei nº 12.830/2013 reforça a autonomia e discricionariedade técnica do delegado, consolidando a credibilidade do procedimento investigativo.

A doutrina contemporânea tem revisitado o papel do inquérito à luz do sistema acusatório. Douglas Fischer (2023) destaca que o inquérito deixou de ser mero procedimento inquisitivo para tornar-se instrumento de racionalidade probatória e filtro de legalidade. O Supremo Tribunal Federal, no Inquérito 4.831/DF (2022), reafirmou que a investigação deve observar proporcionalidade e razoabilidade, sob controle judicial e ministerial, evidenciando a evolução do instrumento como mecanismo democrático de proteção à legalidade e aos direitos fundamentais.

Na era digital, o inquérito incorporou novas ferramentas, como perícias digitais, inteligência artificial e bancos de dados, transformando a coleta de provas. A Lei nº 13.964/2019 instituiu a cadeia de custódia, reforçando a integridade das provas digitais, enquanto a Lei Geral de Proteção de Dados (Lei nº 13.709/2018) estabelece limites à coleta e compartilhamento de informações pessoais, exigindo do delegado atuação pautada na proporcionalidade e finalidade da investigação (Cunha, 2022).

O respeito aos direitos humanos é elemento indissociável da investigação criminal contemporânea. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, incorporada ao ordenamento jurídico com status supralegal, determina que as investigações respeitem o devido processo legal. Lênio Streck (2021) alerta que práticas autoritárias comprometem a validade das provas e podem levar à nulidade do processo. Nesse sentido, o inquérito atua como instrumento de proteção tanto ao investigado quanto à vítima, funcionando como filtro do poder punitivo estatal.

Em síntese, o inquérito policial, frequentemente subestimado, revela-se peça central na engrenagem da persecução penal, garantindo legalidade, proteção de direitos fundamentais e racionalidade processual. A modernização das investigações, a valorização do delegado como garantidor da legalidade e a observância dos princípios constitucionais consolidam o inquérito como ferramenta indispensável para um processo penal justo e democrático, reforçando o Estado Democrático de Direito e contribuindo para a efetividade da justiça penal.

Referências

BRASILEIRO DE LIMA, Renato. Manual de Processo Penal. 8. ed. Salvador: JusPodivm, 2021.

CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2022.

CUNHA, Rogério Sanches. Investigação Criminal Contemporânea. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2022.

FISCHER, Douglas. O inquérito policial e o sistema acusatório no Brasil. Brasília: IDP, 2023.

MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional Aplicado. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2022.

NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 19. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2020.

STF – Supremo Tribunal Federal. Inquérito 4.831/DF. Rel. Min. Alexandre de Moraes. Julgado em 2022.

STJ – Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 597.405/RS. Rel. Min. Ribeiro Dantas. Julgado em 2020.

STRECK, Lênio. Hermenêutica Jurídica e(m) Crise. 13. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2021.

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