Natali de Moura Nascimento

Violência de gênero e atendimento Jurídico humanizado: O papel transformador de uma Advocacia sensível, preparada e comprometida

Postado em 30 de julho de 2025 Por Natali de Moura Nascimento Advogada, mestranda em Direitos Humanos pela UFPE, presidente da Comissão de Igualdade Racial da Subseção Limoeiro, membra da Comissão de Defesa da Criança e do Adolescente e atuante no enfrentamento à violência de gênero com perspectiva interseccional.

Falar sobre violência de gênero no Brasil, e em especial Pernambuco, é enfrentar uma realidade dura, marcada por estatísticas alarmantes, histórias de dor, silêncios culturais e estigmas. Mas é também, e sobretudo, falar da urgência por transformações estruturais, especialmente no sistema de justiça. E, nesse cenário, o atendimento jurídico humanizado deixa de ser um ideal e passa a ser uma necessidade vital para mitigar o cenário de revitimização.

A atuação da advocacia, nesse contexto, deve ir além da técnica. É claro que o domínio das leis, dos procedimentos e dos prazos é indispensável e comum na prática da advocacia. No entanto, quando o assunto é violência de gênero, isso não basta. É necessária uma escuta empática, um acolhimento sem julgamentos, bem como compreender o impacto da dor e não contribuir para a revitimização, um fenômeno infelizmente ainda recorrente, inclusive dentro das instituições que deveriam proteger.

Muitas vítimas chegam ao sistema de justiça já fragilizadas por violências físicas, psicológicas, sexuais e patrimoniais. E, ao buscarem amparo, enfrentam, muitas vezes, mais uma violência: a institucional. Seja na delegacia que recusa o registro da ocorrência, no servidor público que duvida do relato, ou no julgamento atravessado por estigmas raciais, de classe, de orientação sexual ou identidade de gênero, o que se presencia é um ciclo contínuo de negação de direitos.

Nesse cenário, a advocacia precisa se posicionar como prática de resistência e transformação. Resistência contra um sistema que ainda insiste em silenciar, culpar e descartar as vítimas. Transformação, no sentido de construir novos caminhos de justiça; mais humanos, mais justos, mais atentos à complexidade da vida real.

Um atendimento jurídico humanizado exige também compromisso ético com a escuta ativa, com o respeito à autonomia das vítimas, com a articulação em rede e com a

produção de saberes jurídicos que não desconsiderem as realidades sociais. Não se trata de “militância”, como muitos tentam deslegitimar, mas sim de responsabilidade social da advocacia com os direitos fundamentais.

É papel da advocacia questionar práticas revitimizantes, denunciar omissões institucionais e buscar respostas eficazes. Significa atuar com sensibilidade diante de um relato de abuso, saber que cada silêncio carrega uma história, e que cada história demanda cuidado, tempo e respeito.

O que se espera dos profissionais do direito que atuam no âmbito da violência de gênero não é heroísmo, se espera humanidade e preparo. É saber que será necessário muitas vezes enfrentar um sistema que reproduz desigualdades e que nosso dever é enfrentá-las dentro e fora das salas de audiência.

A luta por um atendimento jurídico humanizado é, portanto, uma luta coletiva. É uma prática que deve ser antirracista, antimisógina, plural e acessível. Que compreenda a dor, mas que também a transforme em ação. Que entenda que o Direito não é apenas ferramenta de controle, mas também de libertação.

Em tempos de retrocessos e banalização da dor alheia, é urgente reafirmar o compromisso com uma advocacia que abrace seu papel social. Porque, no fim das contas, resistir também é advogar, e advogar com humanidade é, sim, um ato político.

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