A nova legislação educacional, instituída pelo Ministério da Educação (MEC) por meio do Decreto nº 12.456/2025, de 19 de maio de 2025, vedou a oferta de cursos de graduação em Direito na modalidade de Educação a Distância (EAD), estabelecendo que essa formação deverá ocorrer exclusivamente de maneira presencial.
Embora a defesa da educação jurídica na modalidade a distância (EAD) se apoie no ideal da democratização do acesso ao ensino superior, essa aparente inclusão revela-se uma ilusão perigosa e representa um risco real à qualidade da Justiça no Brasil. Formar juristas, profissionais responsáveis por interpretar e aplicar normas que afetam vidas, liberdades e patrimônios, exclusivamente por meio de telas e módulos digitais é um equívoco grave. Tal abordagem compromete a essência do Direito, que se fundamenta na axiologia, no diálogo crítico e nos princípios que sustentam a ordem jurídica
O Direito não é um amontoado de códigos a ser memorizado. É uma arte prática, um laboratório humano complexo que se aprende na troca direta, no calor do debate em sala de aula, e às vezes, na observação minuciosa da linguagem corporal e da retórica do adversário, na pressão palpável de uma audiência, na orientação “in loco” em um estágio real. Como ensinar a arte da argumentação oral persuasiva, a leitura de microexpressões em uma testemunha, ou a construção de uma estratégia processual coletiva em fóruns assíncronos? O “contato humano” não é um luxo acadêmico; é o substrato onde se desenvolvem a ética, a postura profissional, o tato para o conflito e a capacidade de improviso – habilidades intransferíveis pela melhor das plataformas virtuais.
A experiência prática, coração da educação jurídica, é irremediavelmente esvaziada no EAD. Estágios supervisionados “de verdade”, Núcleos de Prática Jurídicaque atendem pessoas reais em situações reais, aulas de campo em unidades judiciárias e em penitenciárias, tudo isso se torna logística complexa, frequentemente terceirizada ou reduzida a simulacros virtuais. O aluno perde a imersão no “mundo jurídico concreto”, ficando refém de uma abstração teórica desconectada da realidade espinhosa dos tribunais e escritórios.
O modelo EAD, pela sua natureza massificada e muitas vezes voltada ao lucro fácil, é terreno fértil para a mediocridade. Tutores sobrecarregados, aulas gravadas que engessam o debate, avaliações padronizadas que não medem habilidades práticas e um controle de qualidade frágil abrem caminho para a formação de profissionais despreparados. A fiscalização do MEC e da OAB, por mais bem-intencionada que seja, é insuficiente para coibir a proliferação de cursos que vendem diplomas, não competência.
Por mais que as vantagens da Educação a Distância (EAD) sejam reconhecidas em diversas áreas, sua aplicação à formação jurídica apresenta limitações significativas. A defesa da EAD no campo do Direito ignora as particularidades da profissão, cuja prática requer não apenas domínio técnico, mas também vivência ética, argumentação crítica e interação dialógica. Promover o acesso à educação jurídica em prejuízo da qualidade formativa não representa inclusão autêntica, mas sim um comprometimento da efetividade e da credibilidade do sistema jurídico.
A educação jurídica não se limita à capacitação técnica, mas envolve a preparação de futuros magistrados, membros do Ministério Público, advogados e defensores públicos, cujas atribuições impactam diretamente a concretização da Justiça. Permitir que esse processo educacional ocorra predominantemente na modalidade a distância configura uma medida temerária, cujas consequências podem comprometer a qualidade dos profissionais e fragilizar ainda mais o sistema de justiça. A aparente conveniência dessa modalidade impõe um custo elevado: a erosão da credibilidade do próprio ordenamento jurídico. A formação em Direito, por sua natureza, demanda presença, interação e vivência prática.
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