Daniella Mesquita Maia da Costa

A penhora de milhas aéreas e pontos de fidelidade: Uma nova perspectiva na efetividade da execução civil

Postado em 20 de agosto de 2025 Por Daniella Mesquita Maia da Costa Advogada, especialista em Execução Civil. Membro das Comissões de Direito Bancário e da Mulher Advogada da OAB/PE.

A execução civil brasileira enfrenta, há décadas, o desafio de garantir a efetividade na satisfação dos créditos. Muitas vezes, as diligências tradicionais — como bloqueio de valores via SISBAJUD, RENAJUD e INFOJUD — mostram-se infrutíferas. Esse cenário estimula magistrados e credores a buscarem alternativas inovadoras.

Nesse contexto, recente decisão do juiz José Carlos de França Carvalho Neto (1ª Vara Cível da Lapa/SP, Processo nº 0012495-64.2023.8.26.0004) autorizou o envio de ofícios à Associação Brasileira de Participantes de Programas de Milhas Aéreas e à Associação Brasileira das Empresas de Mercado de Fidelização para verificar créditos de milhas em nome de 12 devedores, visando garantir o pagamento de R$ 3,7 mil em custas processuais.

Embora ainda relativamente recente, a penhora de milhas e pontos de fidelidade vem ganhando espaço como instrumento legítimo e eficaz na execução.

A medida encontra respaldo no art. 797 do Código de Processo Civil (Lei nº 13.105/2015), que estabelece que “ressalvadas as restrições previstas em lei, responde o devedor, para o cumprimento de suas obrigações, com todos os seus bens”.

Além disso, o art. 835, XIII, do CPC admite expressamente a penhora de “outros direitos” — categoria na qual se incluem créditos de milhas e pontos de programas de fidelidade, dada sua natureza patrimonial.

Os arts. 855 a 860 do CPC disciplinam a penhora de créditos, procedimento aplicável aos programas de fidelidade por envolverem direitos com expressão econômica e possibilidade de alienação.

O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ/SP) já consolidou entendimento favorável à penhora de milhas aéreas, considerando-as bens com valor econômico e negociáveis no mercado. Entre os precedentes, destacam-se:

  • 2023 – Caso amplamente divulgado envolvendo a penhora de milhas do ex-piloto Emerson Fittipaldi para quitação de dívida de R$ 691 mil.
  • TRT-2 – Processo nº 0001478-96.2014.5.02.0446: expedição de ofício para penhora de pontos de cartão de crédito e milhas, reforçando a aplicabilidade no âmbito trabalhista.

Os programas de fidelidade, criados como estratégia de retenção de clientes, permitem o acúmulo de pontos ou milhas a partir do consumo de produtos e serviços. Esses créditos podem ser utilizados para a aquisição de passagens, produtos, descontos e, inclusive, comercializados.

Empresas especializadas atuam na compra e revenda de milhas, viabilizando a conversão rápida desses ativos intangíveis em dinheiro. Essa característica reforça sua penhorabilidade e utilidade como meio de satisfação do crédito.

Conforme lecionam Gagliano e Pamplona Filho (2025), o crédito é, por excelência, um direito patrimonial transmissível, capaz de integrar o acervo de bens do devedor e, portanto, sujeito à constrição judicial, desde que possua expressão econômica e possibilidade de alienação.

O Projeto de Lei nº 523/2025, em tramitação no Senado Federal, propõe explicitar a possibilidade de penhora de pontos e milhas de programas de fidelidade para quitação de débitos. A proposta visa conferir maior segurança jurídica e uniformidade à aplicação dessa modalidade de constrição patrimonial.

A decisão da 1ª Vara Cível da Lapa/SP evidencia a evolução da execução civil no Brasil, incorporando ativos intangíveis e de natureza digital ao rol de bens penhoráveis.

A consolidação jurisprudencial e a eventual alteração legislativa com o PL 523/2025 podem transformar a penhora de milhas e pontos em ferramenta de uso rotineiro, garantindo maior efetividade, celeridade e adequação da execução à realidade econômica atual.

A Editora OAB/PE Digital não se responsabiliza pelas opiniões e informações dos artigos, que são responsabilidade dos autores.

Envie seu artigo, a fim de que seja publicado em uma das várias seções do portal após conformidade editorial.

Gostou? Compartilhe esse Conteúdo.

Fale Conosco pelo WhatsApp
Ir para o Topo do Site