Antonio Joaquim Ribeiro Junior

A responsabilidade dos municípios na segurança pública

Postado em 20 de agosto de 2025 Por Antonio Joaquim Ribeiro Júnior Advogado. Sócio Fundador do Escritório Antonio Ribeiro Advogados Associados. Mestre em Direito, Mercado, Compliance e Segurança. Pós-graduado em Direito Eleitoral e Licitações e Contratos – Lei 14.133/21. Possui advocacia militante na área de Direito Público, com ênfase em Direito Administrativo, Constitucional e Eleitoral. Além disso, possui expertise no Direito Privado, com destaque para Compliance, Terceiro Setor e assessoria em Compras Públicas para pessoas jurídicas. É membro da ABRADEP – Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político, e atua como Coordenador Jurídico da Editora da OAB/PE. Já exerceu as funções de Diretor e Coordenador da Escola Superior de Advocacia (ESA) da OAB-PE, Diretor da ABAM – Associação Brasileira da Advocacia Municipalista, Procurador-Geral do Município de Arcoverde-PE e Assessor Jurídico do Município de Araçoiaba-PE.

1 – Introdução

Recentemente, no mês de junho, o Tribunal de Contas do Estado (TCE/PE) divulgou o Painel de Referência da Segurança Pública, com informações inéditas sobre a atuação dos Municípios Pernambucanos na realização de políticas públicas locais, tanto de forma específica quanto em conjunto com os demais entes da Federação.

Os dados são alarmantes e identificam que 97% dos Municípios do Estado de Pernambuco têm deficiências na implementação de políticas públicas de segurança. Entre os números apresentados, destacam-se: 92% dos municípios não possuem Plano Municipal de Segurança Pública; e 97% não realizam um diagnóstico da segurança local.

Na semana passada, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública apresentou o 19º Anuário Brasileiro de Segurança Pública, com o ranking das 10 cidades mais violentas do país, no qual os Municípios de Cabo de Santo Agostinho e São Lourenço da Mata figuram em quinto e sexto lugar, respectivamente.

O levantamento do Tribunal de Contas e o anuário intensificam o debate sobre a segurança pública no Estado e o papel de cada ente e entidade no desenvolvimento e na efetivação de medidas de prevenção, promoção e repressão nos espaços públicos.

Nesse cenário, tem-se perguntado: os municípios têm responsabilidade na elaboração de políticas públicas de segurança? Qual a forma de atuação? Essas e outras perguntas tentaremos responder a seguir.

 2 – Sistema Único de Segurança Pública (SUSP)

Apesar de ter sido publicada em 11 de junho de 2018, com 7 anos de vigência, a Lei nº 13.675, que institui o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP) e criou a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS), ainda é pouco conhecida da população e dos entes da Federação, sobretudo dos Municípios Brasileiros.

O desconhecimento da norma e de seu conteúdo pode ter explicação no axioma, difundido de forma equivocada, de que a segurança pública não é responsabilidade dos municípios. Contudo, desde a promulgação da Constituição de 1988, está em vigor o art. 144, que prevê a participação compartilhada da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios no combate à violência e na defesa social da população.

É importante lembrar que a Constituição de 1988 também previu, no art. 30, I, que é de competência do Município dispor e legislar sobre os temas de interesse local. Esse dispositivo constitucional ratifica a tese da responsabilidade dos municípios, prevista no art. 144, na consecução e colaboração na execução de políticas públicas de segurança.

Em 2018, a Lei nº 13.675 resolveu as distorções interpretativas sobre a participação dos municípios na defesa social ao delinear expressamente a responsabilidade compartilhada entre os entes da Federação:

Art. 9º É instituído o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), que tem como órgão central o Ministério Extraordinário da Segurança Pública e é integrado pelos órgãos de que trata o art. 144 da Constituição Federal, pelos agentes penitenciários, pelas guardas municipais e pelos demais integrantes estratégicos e operacionais, que atuarão nos limites de suas competências, de forma cooperativa, sistêmica e harmônica. (Vide ADPF 995)

§ 1º São integrantes estratégicos do Susp:

I – a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, por intermédio dos respectivos Poderes Executivos.

O Supremo Tribunal Federal (STF), no RE 846.854/SP, reconheceu que as Guardas Municipais executam atividade de segurança pública (art. 144, § 8º, da CF), sendo os municípios parte do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), o que foi afiançado na ADI nº ADI 5538¹, julgada em 1º de março de 2021.

No entanto, até o momento, a atuação dos municípios no desenvolvimento de políticas de defesa social é um grande limbo, quase inexistente ou resumida a medidas ostensivas de repressão, geralmente instrumentalizadas pela Guarda Municipal.

A escassez ou a limitação na concepção sobre o papel dos municípios na segurança pública têm levado ao desperdício de recursos e de projetos já em execução que podem ser utilizados concomitantemente na projeção de interesses comuns entre o Município, Estados, Distrito Federal e União.

 3 – Políticas Públicas em Segurança

Apesar da quase anomia de políticas públicas em segurança, os Municípios Pernambucanos têm um exemplo bem-sucedido de programa de combate à violência. Trata-se do modelo do Pacto pela Vida entre os anos de 2007 e 2013.

Nessa época, ainda sob a gestão do Governador Eduardo Campos e coordenado pelo sociólogo José Luiz Ratton, o PPV – Programa Pacto pela Vida foi instituído como política pública utilizando como indicador para aferir o êxito das políticas implementadas o resultado dos Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLI). Todavia, diferentemente da percepção inicial, o projeto não se resumiu apenas à atuação repressiva das Polícias Civil e Militar.

O PPV era um programa heterogêneo, com a participação do Executivo, Legislativo, Judiciário e da Sociedade Civil Organizada na construção de um sistema de segurança pública. O programa contou com um trabalho científico robusto na coleta e na sistematização de dados e informações, como pressuposto para o melhor diagnóstico da situação do Estado e a criação de atividades e ações específicas no combate à violência.

Além do PPV no Estado, o Ministério Público desenvolveu um projeto concebido como o Pacto dos Municípios pela Segurança Pública. A cidade do Jaboatão dos Guararapes, à época foi o primeiro município a aderir à coalizão com o MPPE².

Naquele momento, já no ano de 2013, com a influência do PPV de 2007, Jaboatão dos Guararapes desenvolveu políticas municipais de acordo com suas características e necessidades, implementando trabalhos multidisciplinares em diversas áreas da administração pública com foco também no combate à violência.

Entre as ações desenvolvidas estavam: a melhoria da iluminação pública, o cadastro de bares, boates e restaurantes, a fiscalização e o cumprimento da Lei Estadual nº 10.454/1990, que trata do perímetro de segurança nas escolas, parcerias com escolas e Instituições de Ensino Superior (IES), cursos, capacitações e outras.

Mais recente, o Município do Recife tem buscado por meio de princípios do Pacto Pela Vida de 2007, erguer uma política pública de segurança. Apesar de diferente do que foi feito pelo Estado, a cidade do Recife implementa projetos de integração de políticas públicas com o viés de diminuição da violência, com destaque para o COMPAZ e os serviços de esportes e lazer desenvolvidos pela Secretaria de Esportes dentro das comunidades.

Assim como Jaboatão dos Guararapes e Recife, os demais municípios do Estado devem realizar políticas próprias de segurança pública, e isso parte consideravelmente da visão dos gestores sobre a responsabilidade municipal e do aproveitamento de programas já existentes para o enfoque específico.

As ações municipais devem ir além do lugar-comum relacionado à criação e à estruturação de uma Guarda Municipal. É pacífico que a Guarda é um ponto importante da política municipal, mas não pode ser o único.

É salutar que os entes diversifiquem as ações em promoção, prevenção e repressão, com a participação da população por meio de conselhos e comissões, trabalhos próprios para as secretarias de Educação, Desenvolvimento Econômico, Esporte, Lazer, Assistência Social e outras, bem como a participação da iniciativa privada.

As políticas públicas devem ser desenvolvidas de forma integrada, com a presença do combate à violência na infância, na família, na assistência social e epidemiológica. Afinal, como alertado por Isaac Luna, especialista em políticas de segurança pública, “na ausência de Estado, o crime prospera”³.

O tempo urge e a população clama. Não cabe mais aos municípios esperar. É chegada a hora da boa governança das políticas públicas para efetivar a participação no Sistema Único de Segurança Pública, com a construção de legislações que os insiram no radar da prospecção de recursos e investimentos em segurança.

Referências:

¹ A Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5538 versou sobre a (in)constitucionalidade de normas restritivas do porte de arma para Guardas Municipais.

² Matéria publicada no Diário Oficial do Estado de Pernambuco em 18 de setembro de 2013.

³ “Na ausência do Estado, o crime prospera”, diz especialista. Disponível em: https://ne10.uol.com.br/canal/noticias/grande-recife/noticia/2017/02/22/na-ausencia-do-estado-o-crime-prospera-diz-especialista-664103.php. Acesso em 28 de julho de 2025.

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