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O Comitê Gestor do IBS: Natureza Jurídica e Seu Papel no Pacto Federativo

Postado em 14 de maio de 2025 Por Anna Flávia Loureiro Cavalcanti Batista Advogada. Mestre em Direito Tributário pelo IBET. Especialista em Direito Tributário pelo IBET e em Processo Tributário pela UFPE. Professora Seminarista do Curso de Especialização em Direito Tributário do IBET. Autora. Secretária da Comissão Especial de Processo Fiscal (CEPF) da OAB/PE.

A Emenda Constitucional n⁰ 132/2023 implementou uma profunda reforma na tributação sobre o consumo brasileira, introduzindo, para além do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), o Imposto Seletivo (IS). A nova sistemática, recém instituída pela Lei Complementar n⁰ 214/2025, promove uma substituição gradual do ICMS, ISS, PIS, COFINS e, parcialmente, do IPI, antes cobrados na origem da operação, para uma sistemática de arrecadação fincada no destino, o que traz profundos impactos em termos de competência tributária e pacto federativo.   

Tal inovação no Sistema Tributário vem acompanhada da criação do Comitê Gestor do IBS, “entidade” pública, responsável pela distribuição do produto da arrecadação do imposto (Art. 156-A, §4⁰ da CF) e pelo exercício da competência tributária (Art. 156-B, caput da CF) dos Estados, Distrito Federal e Municípios, em decorrência do Princípio da cooperação (Art. 145, §3⁰ da CF) e da competência compartilhada (Art. 156-A, caput da CF) entre estes Entes. Assim, entre suas principais funções estão: arrecadação, fiscalização e distribuição da receita, além da regulamentação operacional do imposto, o que exige alto grau de coordenação técnica e política, além de sistemas de informação integrados.

Como a competência tributária, em relação ao IBS, não será exercida diretamente pelos Entes federados, mas por meio do Comitê Gestor – a ser instituído por meio de Lei Complementar (PLP n⁰ 68/2024), a Constituição determinou que sua composição seja paritária (Art. 156-B, §2⁰, I da CF), assim como lhe concedeu independência técnica, administrativa, orçamentária e financeira (Art. 156-B, §1⁰ da CF). 

Esse alto grau de concentração de poder tem gerado preocupação e questionamentos quanto a sua natureza jurídica e seu papel no pacto federativo, pois sua atuação será decisiva para assegurar transparência, eficiência e a neutralidade pretendidas. Em contrapartida, ao centralizar essas funções em um único “órgão”, evitase a sobreposição de competências e, aparentemente, reduz-se a guerra fiscal.

Sob a perspectiva do pacto federativo, o Comitê Gestor representa uma tentativa de harmonização, sem subordinação, entre a atuação dos Entes federativos, optando-se por um modelo cooperativo em que as decisões são tomadas de forma colegiada, o que pode promover a coordenação necessária para o funcionamento do IBS. Contudo, isso essa pode ser uma ameaça, a medida em que: a) o Distrito Federal possui representação assegurada tanto no grupo dos estados como no grupo dos municípios, concedendo-lhe duplo voto e; b) embora cada Estado possua cadeira no Comitê Gestor, não há como todos os 5.570 Municípios terem representatividade garantida, de forma que apenas 27 (Art. 156-B, § 3º)representarão os interesses de todos. Isso tanto é verdade que os Municípios acabaram por travar uma batalha judicial para a indicação de seus representantes.

Do ponto de vista jurídico, enquanto “órgão” paritário, a CF/88 o referiu como uma “entidade pública sob regime especial”, por não se enquadrar, diretamente, como uma autarquia, nem, tampouco, como um órgão da União ou de qualquer outro Ente. Trata-se, em verdade, de uma entidade intergovernamental, dotada de personalidade

jurídica própria, independente e autônoma, vinculada diretamente à Federação como um todo, e não a um único Ente, com vistas a evitar supremacia de um sobre os demais.

Neste sentido, embora se verifique uma indeterminação na natureza jurídica do Comitê Gestor, o que reflete a complexidade de se criar um órgão que represente, simultaneamente, todos os níveis federativos, é possível afirmar que não pode ser classificada como um órgão da administração pública indireta, haja vista sua composição ser paritária, de modo que possui natureza jurídica híbrida, peculiar e sui generes, combinando elementos administrativos e políticos dos mais diversos Entes, cabendo à Lei Complementar vindoura e à prática institucional, a preservação do efetivo equilíbrio do pacto federativo, de forma que seu sucesso dependerá, não apenas de sua estrutura legal, mas do espírito de cooperação entre os Entes, que, em tempos de polarização política e disputa por recursos, será desafiadora, mas essencial.

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